PROGRAMA PIRACICABA HISTÓRIAS E
MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado, 18 de janeiro de 2014.
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado, 18 de janeiro de 2014.
Entrevista: Publicada aos sábados
na Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
http://blognassif.blogspot.com/
ENTREVISTADO: TULIO RODOLFO ANGELOCCI
O homem
é um ser eminentemente social, isto é, tem a perpétua tendência a se agrupar,
de unir-se a seus semelhantes, para satisfazer suas necessidades materiais e de
cultura. A vida do homem decorre em convivência: os indivíduos em todas as
etapas de suas vidas, do berço ao túmulo, mantêm entre si mútuas e constantes
relações de colaboração e de dependência. Dessa forma, pode-se considerar que a
vida em sociedade é o modo natural da existência da espécie humana. O que
precisamos compreender é que as pessoas desde sua origem recebem influencia de
culturas, família, religião, escola, amigos, ambientes de trabalho e o bom
relacionamento só se aperfeiçoa quando respeitamos o outro com suas
particularidades, revendo possíveis necessidades de mudanças. Se esforçando a
cada dia, em conhecer o outro implica em ter um vasto conhecimento da natureza
humana e das motivações mais comuns e freqüentes que
impulsionam
o homem a agir. Não só as pessoas são diferentes entre si, mas também as
necessidades que variam de individuo para individuo. E é exatamente essa grande
diversidade que se constitui em uma das imensas riquezas humanas, por isso é
necessário que se faça respeitar as diferenças. O homem isolado é uma ficção,
porque ele sempre trás consigo uma dimensão que não pode ser destacada que é a
sua condição social e histórica. O homem vive em comunidade associados aos
outros indivíduos de sua espécie. Porém é o único que fala, pensa, aprende e
ensina, transforma a si e a natureza, O homem é cultura, é história. Temos
inúmeras entidades assistências, filantrópicas, religiosas, clubes de serviços,
grupos de amigos com as mais variadas denominações. Assim nasceu o Clube do
João, onde a única exigência é que seu filiado se chame João. Em uma cidade
vizinha, criaram o “Clube dos Limparianos”, uma entidade que promove um jantar
e onde o freqüentador tem que literalmente “limpar” o prato, ou seja não deixar
sobrar nenhum alimento. Há uma infinidade de associações motivadas por
princípios, regionalismos, mas que no fundo todas têm o mesmo objetivo: a união
dos que de alguma forma tem alguns pensamentos em comum. Entre as entidades
piracicabanas, uma se assemelha muito com a famosa “Boca Maldita” de Curitiba,
uma entidade tão respeitada que tem uma escultura em forma estilizada de boca,
em plena Rua das Flores, ponto central e nervoso da capital paranaense. Em
Piracicaba temos a “Turma do Sereno”, um grupo eclético, com personalidades que
exercem as mais diferentes funções profissionais. Desde autoridades até
profissionais liberais. Ali se encontram para “um dedo de prosa” empresários,
artistas renomados, políticos de grande projeção local e nacional, escritores,
jornalistas, pode-se dizer que é para onde converge a “inteligenzia” piracicabana.
Embora não haja discriminação a grande maioria, talvez até por tradição, é
constituída pelo publico masculino. Tulio Rodolfo Angelocci é um dos
freqüentadores habituais da “Turma do Sereno”. Nascido a 26 de fevereiro de
1951 é filho de José Angelocci e Maria Antonia Rosa Angelocci. Seu pai era
empreiteiro, trabalhou muito em São Paulo, por volta de 1942 a 1943 ele se
casou com sua mãe, tiveram três filhos: José Antônio, Maria Auxiliadora e Tulio
Rodolfo.
Você nasceu em que localidade?
Nasci em Piracicaba, minha avó,
Antonia Calderan, mãe do meu pai, morava na Rua Riachuelo, 656, entre as Ruas
Alferes José Caetano e Rua Boa Morte. Quando eu tinha uns seis anos meu pai
mudou-se para uma casa próxima ao Cine Paulistinha. Depois mudamos para a Rua
São João, entre a Rua Joaquim André e Rua São Francisco, em uma casa da família
de Mário Nicoletti. Moramos ali por volta de uns cinco a seis anos. Mudamos na
mesma rua em uma casa de propriedade de Santo Bueloni, próxima a atual Avenida
Dr. Paulo de Moraes, naquele tempo não existia a Avenida Dr. Paulo de Moraes,
era um pasto onde o Francisco Pelegrino guardava umas toras de madeira. A Rua
Joaquim André vinha até a Rua São João, não havia asfalto, nada. O esgoto era a
céu aberto. Para baixo tinha um ribeirão que denominavam de “Olho da Nhá Rita”,
tinha uma mina de água situada no terreno de David Furlani, sogro do Pedro
(Naoki) Kawai. De lá mudamos para a Rua Manoel Ferraz de Arruda Campos, em
seguida mudamos para a Rua José Ferraz de Carvalho, 844, entre a Rua Governador
Pedro de Toledo e a Rua Boa Morte em uma casa da família dos Pereiras. Ficava
ao lado da casa do Jorge Lordello e da casa do Leo Olita.
Você estudou em que escola?
Estudei no Grupo Escolar Barão do
Rio Branco. Minha mãe trabalhou por muitos anos para Dona Eugênia Galvão, ela
morava em um sobrado na esquina da Rua Moraes Barros. O Seu Angeli estava
começando com seu armazém. Minha primeira professora foi Dona Áurea. Depois
tive aula com Dona Helena, que morava na Rua Governador Pedro de Toledo. O
terceiro ano tive aula com Dona Alice Leitão de Medeiros, mãe de Maria Emília,
José Mário. No quarto ano tive aulas com Dona Elza Romano. Depois fizemos o
curso preparatório cuja professora foi Dona Maria Ângela Pousa Coimbra. Eu já estava com uns 12 anos, fiz
um curso de madureza e comecei a trabalhar.
O que você foi fazer?
Com treze a quatorze anos fui
trabalhar com meu pai, o Sturion tinha a loja, aos domingos saíamos vendendo
roupas, aviamentos, mascateava. Tínhamos muitos amigos que eram granjeiros: o
Oriani, o Francisco Franzol tinha um cavalo chamado Orfeu, o Seu Jorge, Seu
Alexandre. Ia de carroça, naquele tempo era muito raro quem tinha uma condução.
O Seu Mário Sturion tinha uma caminhonete.
Tinha uma mula chamada Menina, um cavalo chamado Poderoso. Só não me
lembro de quem eram.
Você gostava de jogar futebol?
Gostava, eu era centro-médio,
joguei no Bandeirantes, ficava na Avenida Dr. Paulo esquina com a Rua Benjamin
Constant, Tinha o salão do João Marconi, nosso pontinho era ali, existia a
venda do João Elias, o pai do Walter Naime ficava do outro lado. Ali era o
ponto de encontro nosso. Logo acima tinha o bar que era do Pedro Scarpari, ficava
uns 15 metros antes do inicio da Avenida São Paulo. Tinha sido do Bressan, Em
frente era o Bonachella. O Cella começou mesmo na Rua João Conceição esquina
com a Rua Benjamin Constant, em um prédio que era do Julio Vizioli. Antes o
Cella trabalhava no Joanim Fustaino, que ficava na Rua Joaquim André com a Rua
Governador Pedro de Toledo. O Alfredo Bisson começou na Rua do Rosário, 2547,
chamava-se Casa Rosário, depois ele mudou para a Rua Benjamin Constant, alugava
o prédio dos Ferrari, mas manteve o nome Casa Rosário.
Você chegou a pegar a época em
que havia um aterro nas imediações da Rua da Glória?
Ali nós tínhamos o nosso campo.
No inicio era o Paulista, que depois subiu para a Avenida São Paulo, ali ficou
o campo do Bandeirantes. Ali tinha uma mina de água, acho que é uma das
melhores águas que temos na cidade.
Nessa época o Morlet já existia?
Existia uma parte, o quarteirão
da Rua da Glória onde hoje há o pontilhão era fechado, quem abriu foi Luciano
Guidotti. Ali era campo nosso, o Bandeirantes jogava ali. Em frente ao Toninho
Lubrificantes, que na época era do Pelegrino, havia uma área de terras, onde
hoje funciona a garagem de ambulância. Lá tínhamos um campinho, todo dia a
tarde tinha um rachinha nosso. Pedimos ao prefeito Luciano Guidotti, ele passou
a máquina para endireitar o terreno. Do lado havia a Padaria Cruzeiro que era
da família Sachs, Seu Guido, Seu Berto. O ponto final do bonde é onde hoje
existe um prédio, ao lado onde há até hoje as primeiras instalações do Corpo de
Bombeiros de Piracicaba. O bonde não entrava na garagem toda vez que vinha do
centro, ele parava em frente, era chão de terra.
Você chegou a atravessar a Rua
Benjamin Constant, sobre o pontilhão, caminhando entre os dormentes, onde um
passo em falso poderia ser uma queda de muitos metros de altura?
Passei muitas vezes! Mais
adiante, além da 31 de Março havia um viaduto que era inteirinho de tijolos, em
cima passava a linha da Companhia Paulista de Estradas de Ferro e em baixo,
cruzando, passava a linha da Estrada de Ferro Sorocabana. Ali havia um aterro,
para ir ao campo do Paulista tinha que subir por cima da linha. A Rua da Gloria
vinha até a Avenida Dr. João Conceição, era de terra, morava uma família que
tinha entre seus componentes o Nelson, Nelsinho, Bimbão, Osvaldo, Orlando.
Íamos tomar água gelada na casa deles.
Qual era a cor da camisa do
Paulista?
Era preta, vermelha e branca. Cada
um lavava a sua. No Bandeirantes cada um pagava para lavar sua camisa. A mãe do
nosso amigo José Antonio (Cenoura) lavava.
O Bandeirantes ficava em que
local?
Ficava na Rua Benjamin Constant,
tinha um amigo nosso que às vezes reuníamos na casa dele, o Osmar de Almeida
Prado. Às vezes nos reunimos na casa do Marquinho Pelegrino. Às vezes na
padaria de Guido. Em 1961 ou 1962 teve o campeonato de futebol de salão, o
Bandeirantes foi campeão. Aonde depois veio a ser os sobrados do Romano era o
Sãopaulinho. O Riachuelo era próximo a chácara do Vevé, no fim da Rua
Riachuelo. O time do Unidos era na Paulicéia. Existia o Botafogo, o Juventus do
Bairro Verde.
Você freqüentava o Cine
Paulistinha?
Fui várias vezes lá, conforme
dispunha de recursos. Trabalhei muito para o Seu Salvador Cassano. Pai do
Emílio, do Salvadorzinho.
Com que idade você começou a
trabalhar?
Aos 14 ou15 anos comecei a
trabalhar. Na minha família o único que não trabalhou com hidráulica foi meu
pai, era um bom pedreiro, azulejista de primeira. Fui ajudar meu pai, tinha um
tio, Luiz Angelocci, que estava fazendo os sobrados do Romano, o empreiteiro
era Alfredo Romano. Eram quarenta sobrados. Para terminar os quarenta sobrados
foram de quaro a cinco anos. Minha família, ainda muito novos, começaram a
trabalhara para a Casa Asta, do Antonio Asta.
A Casa Asta ficava aonde?
Ao lado da Igreja Metodista,
próxima ao Mercado Municipal.
Você pegou a época em que o
encanamento não era de PVC?
O chumbo era um material muito
utilizado. A “Turma do Sereno” brinca comigo, dizem que fui encanador do
aqueduto de Roma. Naquele tempo para trocar um pedacinho de cano tinha que
levar a morsa para prender o cano, a tarraxa para fazer a rosca no cano, o arco
de serra, graxa, banha ou um sebo que levávamos estopa, zarcão, chave de cano,
talhadeira, marreta. Era uma oficina, e essas coisas eram pesadas.
Onde era a maior incidência de
defeitos no sifão de chumbo?
O sifão de chumbo ia sendo
corroído, naquele tempo havia uma série de produtos a base de saponáceos que
empastavam e criavam dificuldades para o escoamento da água. Acabava
apodrecendo. Tinham umas barras de chumbo de dois metros, nós pegávamos e
cortávamos, Ele tinha duas polegadas e meia, três polegadas. Era usado para
telefonia também. Você media, cortava ao meio, o chumbo pelo fato de ser
maleável você faz o que quiser. Com um pedaço de cano arredondava bem, unia as
duas partes, naquele tempo o maçarico era a gasolina, bombeava e soldava com
estanho. Quem tinha posses fazia de cobre. Na época o esgoto era todo de
manilha de barro. Quem tinha dinheiro fazia de ferro fundido. A manilha dava
muito movimento, quem tinha condições canizava, jogava concreto em cima dela.
Em 1967 a 1970 é que começaram a vir os tubos de PVC.
Existe muito encanamento de
manilha em Piracicaba?
Existe!
Você chegou a pegar o tempo da
fossa séptica?
Isso acontecia em local sem rede
de esgoto. No próprio bairro da Paulista havia muitas fossas sépticas. Por
volta de 1957 a Rua do Rosário era terra. Até hoje existe muitos lugares onde o
esgoto corre a céu aberto, mesmo o país possuindo recursos. Aonde é a
Rodoviaria Intermunicipal tinha um campo chamado “Bacia”. Onde atualmente é o
Teatro Dr. Losso Netto era o campo de futebol do Ipiranga. A Avenida Armando
Salles de Oliveira não existia. A Rua São Francisco de Assis era de terra.
Embaixo da garagem da prefeitura passa um córrego. Do lado do barracão do Krahenbuhl tem um córrego que vem
lá de cima.
Você continua ainda trabalhando nesse ramo?
Continuo. Calha tem que ver o ponto, a queda, antigamente
a calha era de dois em dois metros, quem fazia calha era o Asta, o Francisco
Crócomo, o Penatti, o Fisher, eles cilindravam com um cano, iam dobrando.
Depois começou a aparecer dobradeira.
Como eram emendados os pedaços de calhas a cada dois
metros?
Eram arrebitadas e estanhadas. O Pizzinatto comprou uma
dobradeira de sete metros, depois comprou o cilindro, a calha saia de 10
metros, era uma beleza. Hoje existe a veda calha, silicone, facilitou tudo.
Qual é a melhor saída para não entupir uma calha com
folhas?
É não ter a arvore por perto. Tem que ser calculado o
número de condutores necessários para a área que a calha vai atender.
Como surgiu a “Turma do Sereno” em sua vida?
Eu estava sempre no centro, sempre fui muito amigo de
Kalifa.
Onde funciona a “Turma do Sereno”
Funciona na calçada em frente ao Banco do Brasil, na
Praça José Bonifácio. É aberto, freqüentam Ésio Pesato, Xuxo Piazza, Raul
Mattos, Mario Rizzo, Adilson Benedito Maluf, Nelson Spada, Bolão, Gabriel
Torossiam, Walter Naime, Paulo Barros, Cipriano Baron, José Maria Cassaniga,
chegou ali, tendo boa conversa e respeito mutuo pode permanecer o tempo que
quiser. Não tem horário para começar. Começa logo cedo, ali falamos de política,
futebol, musica família. É uma reunião de amigos, uma vez por mês fazemos um
jantar.
Tem assunto proibido?
Não existe assuntos proibidos, o que pode ocorrer é a
conversar ser mais reservada. A pessoa é chamada de lado e é explicada à ela o
fato em si.
Mulheres freqüentam a “Turma do Sereno”
Às vezes passam uma ou outra, são cumprimentadas com
educação e respeito. Se permanecerem serão muito bem tratadas, mas geralmente
não permanecem.