PROGRAMA PIRACICABA
HISTÓRIAS E MEMÓRIAS
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 07 de julho de 2018.
JOÃO UMBERTO NASSIF
Jornalista e Radialista
joaonassif@gmail.com
Sábado 07 de julho de 2018.
Entrevista: Publicada aos
sábados no caderno de domingo da Tribuna Piracicabana
As entrevistas também podem ser acessadas através dos seguintes endereços eletrônicos:
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http://www.teleresponde.com.br/
ENTREVISTADA: MARIA APARECIDA CORREIA DE SOUZA
Maria Aparecida Correia de Souza, nasceu na cidade de
Marília, a 16 de setembro de 1947. É filha de Joaquim Correia de Souza e Izaura
Pereira de Souza. Seu pai era viúvo com quatro filhos Maria (Mariquita), José,
Mercedes e Marina. Sua mãe era viúva com três filhos: Áurea, Eduardo e Jandira,
eles casaram-se em segundas núpcias tendo dessa segunda união quatro filhos: as
gêmeas Noêmia e Madalena, Maria Aparecida e Neide, reunindo assim onze filhos
do primeiro e segundo casamento de ambos. Seu pai era pedreiro em Marília, foi
lá que ele faleceu. Sua mãe ficou viúva com todas as crianças, na época
Aparecida tinha quatro anos. Os filhos do seu pai com sua primeira esposa
casaram, foram morar em São Paulo, Paraná, todos que estão vivos mantem contato
até hoje.
A sua mãe ficou viúva pela segunda vez, com onze filhos, qual foi a
primeira providência dela?
Quando meu pai faleceu minha mãe veio para Piracicaba com os
quatro filhos do segundo casamento e dois do segundo casamento, um ficou em
Marília. Os filhos mais velhos já tinham casado ou mudado para São Paulo.
Sua mãe decidiu vir para Piracicaba por alguma razão especial?
Minha avó Georgina já morava aqui com minha tia Hilda, irmã
do meu pai. Naquela época tinham a fábrica de Doces Andrelina. Aqui tinha
condições da minha mãe trabalhar, vender doces, para sustentar os quatro
filhos. Ela vendia doces também da Padaria Vosso Pão, a proprietária era Dona
Augusta, essa padaria ficava onde hoje é o Edificio Canadá, construído por
Virgilio Lopes Fagundes. Existia na Rua Governador Pedro de Toledo , entre a
Rua São José e Moraes Barros a Padaria Inca. A PANSA foi outra padaria que marcou
história na cidade.
Quais eram os doces mais conhecidos?
Eram doces caseiros, marmelada, goiabada, nós ficávamos
limpando as goiabas, éramos todos pequenininhos. Minha mãe saia vender doces
pelas ruas de Piracicaba. O curso primário eu estudei no então Grupo Escolar
Dr. Prudente de Moraes. Depois segui meus estudos já na juventude. Freqüentei a
Escola Modelo, tempo do Alcides. Hoje o ensino está com o acesso muito fácil do
que antes.
Vocês moravam em que local?
Morávamos entre a Rua São João e a Rua Santa Cruz. Era um
corredor de uma rua para outra. Ela assim nos sustentou, vendendo doce. Além da
venda d doce ela passou a lavar roupas para outras famílias. Fomos crescendo.
Aos sete anos eu já trabalhava de babá, fui ajudar a uma doméstica que
trabalhava na casa da Profa. Dra. Marly Therezinha Germano Perecin, seu marido Noedy Perecin. Eu olhava a criança, a Conceição,
filha da empregada da Dra. Marly. Em determinado horário eu saia, ia até a casa
da Dona Lazinha que ficava na Rua São João, ia pegar e entregar marmitas para
funcionários que trabalhavam ali por perto. Passei a trabalhar como doméstica nas casas de
família. Dos sete aos dezessete anos eu trabalhava como empregada doméstica. O
ultimo emprego em que trabalhei como doméstica foi na casa do João Ferraz de
Arruda do 3º Cartório de Notas,
isso no tempo em que não existia enceradeira, o piso de madeira era limpo com
palha de aço, encerado e dado brilho com escovão (uma escova grande assentada
em um pesado suporte de ferro fundido que era movido pelos movimentos dos braços de quem estava trabalhando). Eu
trabalhava também na copa. A Dulce, cunhada da minha irmã, trabalhava como
cozinheira. Na época o Cartório do 3º Ofício ficava na Praça José Bonifácio,
próximo a Rádio Difusora. A casa em que eu trabalhava ficava na parte posterior
do cartório. Nessa época já morávamos na Rua Voluntários de Piracicaba, 1405,
casa 5, na Vila Mercedes, no fundo de onde morava aquela família de
portugueses, Milanes, que tinha banca no Mercado Municipal. Ali se casaram
minhas irmãs, a Jandira casou-se com José Maria, são pais do Dr. José Silvestre da Silva. Em casa ficaram minha irmã mais nova do que eu, a Neide,
uma irmã que veio morar conosco com suas duas filhas pequenas: Fátima e
Soninha, minha mãe e eu.
Você casou-se?
Casei-me com Dalvi Rodrigues Ele trabalhou
muito tempo na UNIMEp. Minha irmã Neide casou-se com o irmão dele. Tivemos uma
filha Rossana. Namoramos por três anos e meio, casamos e permanecemos casados
por três anos e meio.
Como você foi trabalhar no Cartório?
Eu trabalhava como empregada doméstica na
casa anexa ao Cartório do 3º Ofício, minha mãe vendia doces. Um dia estava indo
para casa, um senhor perguntou-me se era filha da Inês. Disse-lhe que não.
Naquele tempo não podia nem conversar com homem; Disse-lhe que a minha mãe
chamava-se Izaura. Ele disse-me: “É que conheço a sua mãe, compro doce dela,
ela pediu para que se pudesse arrumasse um serviço para você, você já tem datilografia)”
(Na equivalia a alguém que atualmente sabe utilizar programas básicos de
computador). Ele prosseguiu: “Tenho uma
amigo, Tácito Morato Kräenbühl (Oficial Maior do Registro de Imóveis da
2ª Circunscrição de Piracicaba). Eu disse-lhe: “-Converse com a minha mãe”. Falei
com a minha mãe, ela confirmou que tinha conversado com esse senhor, O Seu Vinicius trabalhava no Cartório, ligou
no meu trabalho, ele disse-me que dia primeiro de abril eu deveria ir até o 1º Cartório,
isso faz 53 anos, foi em 1964.
Era um período de mudanças sociais no mundo todo?
Aquela época era uma época de muito preconceito, inclusive muito forte com
relação a cor da pele. E o fato de ser afro-descendente a pessoa era física e verbalmente
discriminada. Antes de casar passeávamos no centro de Piracicaba. Os negros
tinham espaço segregado: Rua Morais Barros, Rua Governador Pedro de Toledo e
Rua São José, a calçada que passava pela Praça José Bonifácio em frente os
restaurantes Alvorada, Brasserie, Banco do Brasil. A Praça em si era exclusiva
para brancos. Quando comecei a trabalhar no Cartório, só duas mulheres negras
tinham postos normalmente ocupados por brancas e até mesmo o ambiente
predominante era masculino. A Genoveva era a outra mulher negra que trabalhava
no Banco do Brasil. Mesmo o bonde sendo barato, para nós era difícil pagar. O
bonde que ia para a agronomia passava pela Rua José Pinto de Almeida.
Era chão de terra ainda?
Era terra! Essa Rua Regente Feijó quando
chovia o pessoal chamava de “Rua Escorrega, lá vai um!”.Era só barro! Na Rua Voluntários de Piracicaba, na
Rua Bom Jesus, depois é que veio o calçamento em paralelepípedo.
Você chegou a ver os enterros subindo a Rua
Moraes Barros, o caixão sendo carregado pela Rua Moraes Barros, íngreme, por
homens de terno preto sob um sol causticante?
Lógico! Eu acompanhei o enterro da minha
mãe. Iam segurando o caixão na mão. Não tinha carro. Bem depois disso montavam
barracas de melancia, abacaxi, éramos menininhas, não víamos as épocas desses
eventos para fazer roupas, só se fazia roupas para finados, Festas do Divino. Como trabalhávamos de empregada, no Natal
ganhavamos muita roupa de patroa. Comida quando tinha muita a patroa nos dava
para levar para casa. Hoje muitos que passaram por isso pelo nível de conforto
que possuem são milionários. Conto para minha filha, minhas netas, que a minha
mãe nos criou vendendo doce pelas ruas.
Lembra-se do COMURBA?
Nessa época em que caiu o COMURBA eu
trabalhava de doméstica na casa situada na Rua São João esquina com a Rua Cristiano
Cleopath de propriedade de Luiz Ferreira Grosso. O pai dele, Manoel
Ferreira Grosso. faleceu sob
a queda do COMURBA. Ele era engenheiro, o carro do bombeiro passou com o corpo.
Paramos no período em que você foi admitida
no Cartório de Registro de Imóveis e Anexos ( Protestos, Títulos e Documentos,
Pessoa Jurídica) do Tácito Morato Kräenbühl.
Depois separou tudo. Fomos fazer a
entrevista: Eu, Antonia Tabai Alves e Rita Quadro, vimos o Milton Ramos
escrevendo a máquina ficamos encantadas. No final do dia ele disse para
voltarmos no dia seguinte para trabalhar, nós três voltamos, a Rita saiu, eu e
a Antonia ficamos, a Antonia aposentou-se faz pouco tempo, resolveu parar. Ela
ficou no Kräenbühl até o final. Depois o Tácito faleceu ela ficou com a
Maria Luiza.
O Cartório é hereditário?
Antigamente era.
Você trabalhou em outro cartório?
Fui ao Cartório do Primeiro Oficio, na Rua XV de Novembro
para ver se precisava de serviço fora do horário, eu trabalhava no Kräenbühl e
precisava trabalhar mais para sustentar a minha filha. Comecei fazendo fichário, saia do Kräenbühl, depois
comecei a trabalhar também em “O Diário” de propriedade de Cecílio Elias Netto,
na Rua São José, ficava a noite para pegar os pequenos anúncios. Ia e voltava a
pé até a minha casa no Bairro Verde. Em “O Diário” fiquei uns dois ou três
anos. Tinha três empregos. Até que fui trabalhar no Cartório do Primeiro Oficio
O Seu Olavo Leitão que era o Tabelião se aposentou, ficou o Ben-Hur Galvão do
Amaral ele passou a Tabelião e tinha o Galdino Antonio Grisotto que era o
Oficial Maior. Atualmente Cartório não é mais hereditário, desde que entrei
para trabalhar em Cartório havia a previsão de que o Cartório passasse a ser do
governo, teve o concurso, o Tabelião que nós temos hoje, Oficial
Cartorário: Júlio César Bezerra
Rizzi veio de Ibitinga, por concurso. Tabelião substituto; Paulo José Cardoso. Substituto: Émerson
Akira Gaban. Eu fazia escrituras, mini compras, depois que me aposentei passei
a atender mais o público em balcão. Como tenho bastante conhecimento é mais
vantajoso para o patrão ter alguém assim na frente. Cartório é um serviço de
muita responsabilidade.
Você deve ter presenciado muitas situações curiosas ou diferentes.
Antigamente havia sim, principalmente quando algum herdeiro
discordava da partilha e se negava a assinar, antigamente era terrível, ali no
Cartório da Rua Boa Morte, às vezes saia cadeirada, um dos herdeiros achava que
estava demorando muito saia para beber, quando voltava já arrumava encrenca,
agora melhorou muito. Herdeiros nunca vistos pela família apareciam. São fatos
que acabam sendo conhecidos das pessoas presentes. Temos que agir dentro da
máxima ética. Hoje temos uma boa equipe de funcionários. O Nome
Oficial é: 1º
Tabelião de Notas de Piracicaba, popularmente conhecido como 1º Cartório de
Notas. Data
de Instalação do Cartório: dia16 de agosto de 1822.
Todo atendimento ao público traz grandes satisfações e amizades, mas às
vezes vem alguém de mau humor, como você lida com isso?
Hoje já aprendi! A minha vida é levantar às seis horas da
manhã. Faço o café. Faço o almoço, minha filha é psicóloga com diversos cursos
na área, trabalha em uma escola pública no Bairro Bosque do Lenheiro. Trabalha
com as crianças, tem uma boa relação com elas e com os pais. Ela presta serviço
no Grupo São Francisco que adquiriu
carteiras das operadoras Amhpla e HFC. Trabalha como psicóloga para
contratar funcionários. Por nove anos ela trabalhou na Polibrasil. Só que como
tem duas filhas, a noite ela precisa estar com as crianças. Meu genro é
engenheiro na Delphi que é uma empresa de autopeças norte-americana e uma das
maiores do setor no mundo, contando com cerca de 169.500 empregados. E dá aulas
também. Saio do cartório ao meio dia, passo em casa engulo a comida, pego as
crianças e levo na Vila Rezende. Às 13:00 horas estou no Cartório! À noite
assisto uma novelinha suave, com as crianças, minha filha dá um reforço nos
estudos delas. Com isso tudo encaro as situações sem me estressar! Atendo as
pessoas da melhor forma possível.
Como você vê a educação que é dada as crianças atualmente?
A meu ver a criançada é muito folgada hoje! Antigamente não
era assim. Hoje o celular é uma febre.
Você é uma pessoa muito conhecida em Piracicaba?
Mais do que tostão!
Você nunca teve a tentação de entrar para a política?
Já falaram muito para que eu entrasse, mas nunca quis.
Qual seu hobby?
Gosto de periodicamente viajar, amanhã mesmo vou com uma amiga
assistir a um show de Tiago Abravanel, em São Paulo. Geralmente durmo a meia
noite, às seis horas estou em pé!
Você se considera uma pessoa abençoada por Deus?
Eu digo que tenho Deus 24 horas por dia na minha vida! Às
vezes algo parece que vai dar problema eu confio em Deus. “Sou do tipo que não
deixa o almoço para a janta” sou muito sincera. “Deixei de ser branca para ser
franca”.
O testamento é público?
Antes era qualquer pessoa tinha acesso, hoje não. O
testamento só é entregue se a pessoa tiver falecido e o advogado apresentar a
certidão de óbito. Quando era aberto antes do falecimento da pessoa trazia
muitos inconvenientes, inclusive risco de vida para o doador.
Hoje o seu cargo qual é?
Sou escrevente. Comecei a trabalhar com 17 anos,aposentei-me
pelo IPESP após completar 30 anos de serviço. O Ben-Hur quis que eu
permanecesse no Cartório, recolhi mais 16 anos e aposentei-me pelo INSS.
Cartório é uma prestação de serviço que nunca irá terminar?
Acredito que não irá acabar, pois se trata de uma garantia
ao cidadão. Além das constantes mudanças de leis, que visam atender as
necessidades do público. A internet facilitou muito o acesso rápido às
alterações. Seguir as alterações legais é o que dá validade a um documento.
Você gosta de música?
Gosto! Já fui ao Rio de Janeiro assistir aos desfiles das
Escolas de Samba. Tenho vontade de ir novamente! Aqui em Piracicaba eu saí
desfilando na Escola de Samba “Qual é o Pó?” Eu nem cheguei bem a sair quando
vi tinham arrumado um carro alegórico, eu acompanhava na rua! Minha mãe era viva,
sentávamos na guia da rua para assistir os desfiles na Avenida Armando Salles
de Oliveira. Eu gostava de carnaval, ia no Clube Treze de Maio, depois que
casei não fui mais.
Você conheceu o auditório que existia na Rádio Difusora com shows ao
vivo?
Quando eu tinha uns 10 resolvi ir cantar na Rádio Difusora. Aos
domingos ia cantar e ganhava um pacote de pó de café Morro Grande! Lembro-me do
trem da Estrada de Ferro Sorocabana, do córrego do Itapeva, o trem passava ali
na Avenida Armando Salles. De tarde com a minha mãe íamos pegar cambuquira para
fazer sopa, éramos muito pobres. Minha mãe lavava roupa para um açougueiro, ele
dava aqueles ossos, vinha com carne, fazia aquela sopa! Coisas que dá saudade!
Sopa de fubá com cambuquira!
A corrupção existe pela oportunidade ou pelo caráter da pessoa?
Pelo caráter!
Você gosta de futebol?
Gosto! Sou corintiana! Não sou fanática, sento em uma roda
de amigos e vamos vibrar! Estamos assistindo a Copa do Mundo! A gente quer que
o Brasil ganhe, o Neymar estava movimentando-se menos do que a gente esperava em
alguns jogos. Fica uma torcida!
6 comentários:
Cida é um patrimônio de Piracicaba. Fomos vizinhas, é uma amiga querida. Cida merece sucesso pela exemplar vida.
👏👏👏lindo Cida, sabe que sou sua fã, beijocas pra vc.
Lindo Cida, sabe que sou sua fã, vc é uma vencedora 👊👏👏😘
Parabéns prima bela entrevista
Uma mulher admirável!
Tenho mto carinho por vc! 🌹😘
Eu a conheci frequentei a casa dela viajamos algumas vezes juntas é uma pessoa admirável de caráter forte porém nunca deixou se elevar pelas dificuldades ..criou a Rossana sozinha mulher mãe avó de índole sem igual vc fez a diferença na vida de muitas pessoas obrigada pelo carinho amiga fiel bjs saudades...
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